Sim, ele pode, e vamos explicar o porquê nesse post.
Decidi iniciar logo de cara com a resposta para reafirmar a vocês o nosso compromisso com a objetividade na exposição dos temas. Nosso propósito aqui é transmitir o entendimento sobre o assunto de forma direta, indo direito ao ponto, sempre que possível.
Hoje em dia com tantas tarefas a serem executadas, fica cada vez mais difícil manter-se atualizado sobre os principais temas que envolvem o Poder Legislativo nos municípios. E esse é o nosso objetivo, ou seja, levar até vocês uma informação simples e objetiva que possa ser compreendida com uma rápida leitura do post, aprofundando a discussão do tema quando necessário, óbvio.
Então vamos lá! Sobre o tema de hoje, antes de avançarmos na compreensão é preciso fazer a distinção entre matéria orçamentária e tributária, já que comumente essa diferença causa muita confusão na hora da apresentação de um projeto de lei pelo vereador ou mesmo da emissão de um parecer jurídico ou de comissão permanente da Casa Legislativa.
Primeiramente, as leis tipicamente orçamentárias são as já conhecidas PPA, LDO e LOA, que são o Plano Plurianual, Lei de Diretrizes Orçamentárias e Lei Orçamentária Anual. Essas normas tratam exclusivamente de planejamento a longo prazo e orçamento público tanto em âmbito federal como estadual e municipal. São as normas tipicamente orçamentárias e que têm a iniciativa reservada ao chefe do respectivo Poder Executivo, ou seja, Presidente da República, Governadores de Estados e os Prefeitos.
Já em se tratando de matéria tributária propriamente dita, o universo é bastante abrangente e inclui os códigos tributários de cada ente federativo; tributos de uma forma geral como impostos, taxas e contribuições; isenções e outros benefícios tributários; dentre outros temas.
Assim, não se deve confundir as duas espécies de normas. A primeira representa as leis tipicamente orçamentárias, de iniciativa reservada ao chefe do Executivo, conforme prevê o art.165 da CF/88, enquanto que a segunda espécie se constitui nas genuínas normas tributárias, que são de iniciativa comum ou concorrente entre o chefe do Poder Executivo e membros dos Parlamentos.
O Supremo Tribunal Federal já se posicionou sobre isso no julgamento do ARE 743.480 MG, cuja relatoria coube ao ministro Gilmar Mendes. Vejamos trecho da manifestação do eminente ministro:
“A norma não reserva à iniciativa privativa do presidente da República toda e qualquer lei que cuide de tributos, senão apenas a matéria tributária dos Territórios. Também não incide, na espécie, o art. 165 da CF, uma vez que a restrição nele prevista limita-se às leis orçamentárias plano plurianual, lei de diretrizes orçamentárias e lei orçamentária anual e não alcança os diplomas que aumentem ou reduzam exações fiscais. Ainda que acarretem diminuição das receitas arrecadadas, as leis que concedem benefícios fiscais tais como isenções, remissões, redução de base de cálculo ou alíquota não podem ser enquadradas entre as leis orçamentárias a que se referem o art. 165 da CF. [ARE 743.480 RG, voto do rel. min. Gilmar Mendes, j. 10-10-2013, P, DJE de 20-11-2013, Tema 682.]”
Ficou claro nessa manifestação do Supremo que as leis que concedem benefícios fiscais, ou seja, leis tipicamente tributárias, não podem ser enquadradas ou confundidas com as leis orçamentárias a que se referem o art.165 da Constituição Federal.
Feita essa importante distinção, podemos prosseguir com a análise para afirmar que não existe em nosso ordenamento jurídico qualquer vedação à apresentação de projetos de lei sobre matérias tributárias por parte de membros dos Legislativos municipais, os vereadores.
O professor do IDP – Brasília/DF, João Trindade Cavalcante Filho, mestre e doutor em Direito, Consultor Legislativo do Senado Federal, afirma em sua obra¹ que NÃO É DE INICIATIVA PRIVATIVA do Presidente da República matéria tributária da União.
Esse entendimento, entretanto, é perfeitamente aplicável aos Municípios por força do princípio da simetria no que se refere às regras do processo legislativo federal. O próprio Supremo Tribunal Federal já firmou sua pacífica jurisprudência sobre o tema com a edição de Tese 682 de repercussão geral extraída do julgamento do ARE 743.480 MG, que envolvia a análise e julgamento de norma municipal.
Órgão julgador: Tribunal Pleno
Relator(a): Min. GILMAR MENDES
Julgamento: 10/10/2013
Publicação: 20/11/2013
Ementa
Tributário. Processo legislativo. Iniciativa de lei. 2. Reserva de iniciativa em matéria tributária. Inexistência. 3. Lei municipal que revoga tributo. Iniciativa parlamentar. Constitucionalidade. 4. Iniciativa geral. Inexiste, no atual texto constitucional, previsão de iniciativa exclusiva do Chefe do Executivo em matéria tributária. 5. Repercussão geral reconhecida. 6. Recurso provido. Reafirmação de jurisprudência.
Tema
682 – Reserva de iniciativa de leis que impliquem redução ou extinção de tributos ao Chefe do Poder Executivo.
Tese
Inexiste, na Constituição Federal de 1988, reserva de iniciativa para leis de natureza tributária, inclusive para as que concedam renúncia fiscal. Obs: Redação da tese aprovada nos termos do item 2 da Ata da 12ª Sessão Administrativa do STF, realizada em 09/12/2015.
Vejam vocês que a jurisprudência de nossa Corte Constitucional, o Supremo Tribunal Federal, está pacificamente consolidada sobre esse tema e permite a iniciativa parlamentar quando o assunto envolve tributos de uma forma geral, ou seja, não há qualquer motivo jurídico que impeça o vereador de propor bons projetos de lei acerca de matérias tributárias para o seu município.
Espero mais uma vez ter contribuído para esclarecer esse tema e fico a disposição para críticas e sugestões.
Obrigado.
Alexandre Thuler.
Autor
Referências:
- “Processo Legislativo Constitucional, 2ª edição, Ed. JusPodivm, Salvador, 2016” “Uma repetição é necessária. Matéria tributária da União NÃO É de iniciativa privativa do Presidente da República; a iniciativa reservada prevista no art.61, § 1º, II, b, trata da matéria tributária DOS TERRITÓRIOS. Em outras palavras: MATÉRIA TRIBUTÁRIA DA UNIÃO É CONTEÚDO DE INICIATIVA GERAL, E NÃO PRIVATIVA. O Supremo Tribunal Federal já decidiu que “a Constituição de 1988 admite a iniciativa parlamentar na instauração do processo legislativo em tema de direito tributário” (STF, Pleno, ADI 724/RS, Relator Ministro Celso de Mello, DJ de 27.04.2001).